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Não Há Lugar Para Desculpas no Planeta dos Vampiros

Esta é, para mim, uma das mais importantes “guerras” do século XXI. Batalhas que, de início, nem sempre são políticas: temos, hoje em dia, acesso a muita “informação” e a muita “partilha de ficheiros”. E, no entanto, uma das características mais vincadas que costumo reparar na minha geração – estou com 39 anos – é uma tendencial teimosia para a ausência do pedido de desculpas. De uma verdadeira “partilha”: a das responsabilidades. E, portanto, de um verdadeiro “conhecimento”. Interior. Não lhe é, de todo, exclusiva. Conheço casos angustiantes em gerações mais velhas. E o narcisismo empolado das mais novas – “as mais bem preparadas de sempre” – não tem ajudado. Tanto em amizades como em relacionamentos mais aprofundados parece dominar uma pulsão para a fuga, para o “bater do pé”, para o “eu sou assim” – portanto, “se sou assim”,  “tenho, forçosamente, que estar sempre correcto” – como se o outro não fosse “assado”, para uma atitude mais ou menos esfingica de aparência inquebrantável que, no fundo, nunca nos leva a lado nenhum. “Toda a gente” parece ter razão. Mesmo nos casos mais absurdos. E a solução parece ser, pelo contrário, a de não a tentar encontrar. Pior que tudo é quando pedimos desculpa a este tipo de pessoas e aproveitam para dizerem “não” mais uma vez. Ou quando tentam, porque mostramos “fraqueza”, picar com nova culpabilização. Às vezes com mais força ainda. Porque, no fundo, são pessoas “fortes”. “Fortes” como um pequeno montinho magoado de pedaços de vidro. Uma aspereza e uma tenacidade consegue-se notar nas rugas entesadas de uma face quase encarquilhada por lágrimas secas. Quando as beijamos: têm, pelo contrário, uma grande vontade de morder. De nos fazer sangrar. São “liberais”: porque, no fundo, não se aguentam em nenhuma relação. Não raras vezes afastam-se. Depois de terem deixado para trás o seu pequeno rasto, orgulhoso, de destruição. É desta forma que conseguem compensar problemas antigos. Com este género de “Olho por olho, dente por dente” inconsciente: conseguem operar em nós uma verdadeira “contaminação.” Depois, claro, existem aqueles que estão sempre a pedir desculpa por tudo e por nada. Quando já desistiram devido ao cansaço. Quando já deixaram de perceber o que quer que seja. Apenas com o único objectivo de levantarem uma bandeira para a rendição. Porque, lá bem no fundo, amam. E estão fartos de sangrar. Antes que se transformem num coágulo humano. Todo o sucesso recente de séries televisivas ou de livros direccionados para o tema dos vampiros não foi por acaso. Foi uma auto- identificação que os elevou, novamente, a símbolos maiores da cultura popular. Eles “existem”.


Série Black Mirror está de regresso

A capacidade de auto- questionamento reflecte, quanto a mim positivamente, uma cultura ou civilização. Como, também, a disponibilidade para uma inquirição de dogmas, slogans e mandamentos que petrifiquem, ilusoriamente, demasiada confiança no tempo. Há um “pessimismo” que revela não apenas cautela. Mas um à- vontade que conhece, sem grandes alucinações, a massa, intemporal, com que somos feitos. O “optimismo”, pelo contrário e apesar de ser, habitualmente, declarado com orgulho – como se não fosse mais que egoísmo; um encolher de ombros – revela, não raras vezes, que existe qualquer coisa latente que não se deseja observar. Muito escapismo e pouca vontade de confrontação. Mas enchemo-nos de um outro optimismo – um pouco mais real – quando, em vez de o tentar quebrar, nos pomos, novamente, frente ao espelho. Da autoria do argumentista e crítico de televisão Charlie Brooke: Black Mirror, mini- série com três episódios estreada no fim do ano de 2011, está de regresso a Inglaterra. Apesar do tom apocalíptico – mas como sátira: como não poderia deixar de o ser? –  levanta questões. Não são perguntas fáceis sobre o passado – ao qual é sempre mais fácil apontar o dedo – ou projecções, ingénuas, sobre o “futuro”. Está dentro.